A dificuldade do perdão

Hoje, escreverei algo do fundo do coração que até agora não fui capaz de redigir por medo de me expôr. Mas sinto uma necessidade muito grande de transmitir esta minha experiência para me “libertar” e para ajudar os que possam já ter passado ou estão a passar por uma situação parecida.

Já alguma vez alguém te fez tão mal, manipulou o teu pensamento de tal maneira que te fez duvidar da tua própria pessoa, da tua própria razão e da tua maneira de pensar? Encheu a tua cabeça de tantas barbaridades sobre ti que tu, mesmo sabendo que tinhas razão e que estavas certo(a), continuavas a duvidar e a humilhar-te, pensando que se calhar tinhas sido tu quem agiu mal? E mais, para além disso tudo, influenciou toda gente ao teu redor, aos que te eram próximos, a quem tu te aproximavas para que acabasses o pior possível e te sentisses sozinho? Uma solidão imensa vem ao de cima, afogas-te num mar imenso de emoções e de incertezas, uma vontade de desistir de tudo e querer voltar para meio dos nossos, daqueles que nos protegem e defendem acima de tudo. Como lutar contra isto?

Eu vinha de um mundo cor-de-rosa, o qual eu entendia como mundo real, onde já tinha aprendido o que era o mal e o bem e os limites das pessoas, quer na bondade, quer na maldade. Para mim, as pessoas com a intenção de estragar a vida das outras e deixá-las num buraco bem fundo não existiam. A inveja nunca atingiria un nível tão alto para que levasse alguém a fazer isso. O facto de alguém não ter uma família bem estruturada (apesar de o querer parecer) não poderia fazer com que existisse pessoas tão horriveis. A ganância não levaria a uma tremenda  e constante insatisfação, a uma sensação que lhe falta sempre mais e mais, mesmo que já se tenha tudo. A futilidade e o consumismo, mesmo que eu os conhecesse, não podiam ser tão imponentes.

A verdade, é que, quando cheguei a Barcelona, confrontei-me com uma nova realidade e, mais grave, foi não ter nenhum refúgio por acontecer dentro de onde eu (sobre)vivia. Tive que me afastar das pessoas que acabara de conhecer e de quem hoje poderia ser amiga e limitar-me a ficar sozinha. Pior que isto, é ver a preocupação dos que mais amo, a ligarem-me constantemente por skype, a mandarem-me mensagem enquanto trabalhavam, a incentivar-me ativamente para eu nunca desistir, a esquecerem-se de si próprios e dos seus próprios problemas para me ajudar. Tenho um agradecimento ETERNO para toda a minha família e a do Ricardo (inclusivé ele, claro). Foram incansáveis!!! Eu estava irreconhecível e nem eu tinha noção disso. Só a tive, quando os meus pais vieram a Barcelona e, sem eu dizer nada, a primeira coisa que a minha mãe fez foi agarrar-me nos seus braços e dizer: “Não, tu não ficas mais aqui! Vamos procurar-te uma casa, tu não podes continuar assim!”. Era díficil disfarçar a minha tristeza e o meu sofrimento. Só o conseguia, mais ou menos, na Faculdade.

Agora sei e cada vez tenho observado mais, felizmente não diretamente para comigo, que o mal existe. E, apesar de acreditar que o bem prevalece, o mal é muito forte e afeta-nos muito mais que o bem. Há pessoas que desejam o mal de outras, que influenciam as outras pessoas para que pensem e falem mal de outras, que são felizes assim. Infelizmente, estas pessoas nunca conseguiram ser felizes e então não permitem que outros sejam. Se calhar nem se apercebem disso e nem vale a pena tentar explicar-lhes porque essas pessoas pensam que está sempre tudo contra elas e não veêm mais nada para além disso. Acreditam ainda que os outros têm a intenção de lhes fazer mal e que apenas se estão a proteger. Por isso, acabam por conseguir fazer crer que elas é que são as vítimas e que estão a sofrer muito.

Eu, a partir do momento, que soube que, infelizmente, houve outra pessoa que sofreu como eu, tive a certeza que eu não tinha culpa nenhuma, já não duvidei mais de mim e esqueci os pensamentos de “se calhar devia ter feito de outra forma, se calhar fui eu…”. É engraçado ver como depois, as más pessoas tentam encobrir o que fizeram para que não fiquem mal no papel e, normalmente, até conseguem. Mas eu não quero saber. Eu quero é proteger-me contra essas pessoas e tornar-me mais forte. Não quero ser como aqueles que são fracos e que estão com essas pessoas, mesmo sabendo tudo o que aconteceu, por medo, por fraqueza com a desculpa de “não me fez mal a mim diretamente”. Eu afasto-me. Se for necessário conviver por temas de trabalho faço civilizadamente, sem entrar em confrontos e ponto. Nada mais, sem dar confianças e sem arranjar chatices.

E a pergunta maior que me faço agora é: Será que já a consegui perdoar?. Eu sinto que, em relação ao que me fez sim, que não tenho a necessidade de falar disso, que levo isso como uma aprendizagem para a vida. No entanto, admito que não me é totalmente indiferente, pelo facto de não querer ter nenhum contacto com ela e de evitar estar no mesmo espaço que ela (sem nunca fazer alaridos). Mas sei que algum dia isso vai ter que acontecer, visto que somos da mesma Faculdade, do mesmo ano e do mesmo curso, o que significa que nas teóricas a vejo e que algum dia ficaremos no mesmo grupo de práticas. Mas tudo a seu tempo. Eu considero-me uma pessoa educada e acho que saberei lidar com a situação, mesmo tendo quase a certeza que ela não. Quiçá possa vir a surpreender-me.

Agora, não lhe desejo nenhum mal. Só espero que algum dia a vida lhe mostre que ela agiu mal e que mude, para que mais ninguém tenha que sofrer algo igual. Mas duvido que isso aconteça porque haverá sempre alguém a alimentar estas pessoas. Eu, só tenho pena de na altura, estar tão frágil e de não conseguir ter argumentos suficientes para lhe dar a entender isso. Como nem a podia ver, não me esforcei para falar com ela. Então quando me apercebi que quase toda gente da minha faculdade sabia o que se tinha passado, mas com a versão errada, onde eu era a má e sentir que toda a gente me julgava, mas ninguém era capaz de ser frontal comigo percebi que não valia a pena. Sabia que a história ia ficar esquecida e que tudo ia voltar ao normal, quando surgisse outro tema melhor. E assim foi, eu, com alguma dificuldade, arranjei novos amigos e sei que, pelo menos uma, será para toda a vida e só por isso, valeu a pena. Estou bem e é o que interessa. Simplesmente, quero proteger-me e aos que me rodeiam dessas pessoas e, mais que isso, conseguir sempre perdoar por muito que me custe.

Já dizia Fernando Pessoa: Ser feliz é encontrar força no perdão, esperanças nas batalhas, segurança no palco do medo, amor nos desencontros. É agradecer a Deus a cada minuto pelo milagre da vida.

2 thoughts on “A dificuldade do perdão

  1. Gostei muito de ler o teu texto. Palavras sábias de quem sofreu e passou por situações complicadas… Reconheço algumas das tuas palavras como se tivessem sido escritas por mim, aplicadas certamente a situações completamente diferentes, mas com um elemento comum… O mal que algumas pessoas trazem dentro si… Enfim, e correndo o risco de soar cliché, o que não nos mata, torna-nos mais fortes… És forte! 😉

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